Fernando Santos
Serviço: Netflix, 2020, drama, violência, guerra,
antirracismo. 2h38min
Acaba de chegar o novo filme de Spike Lee, o que já é motivo
suficiente para reservar horário na quarentena, se é que ela ainda existe.
Claro, é mais uma obra contra o racismo do diretor que começou sua luta com
“Faça a Coisa Certa”, desta vez com um apelo ainda mais escancarado.
O momento para o lançamento do filme não poderia ser mais
apropriado, com as manifestações pelo mundo afora após o assassinato brutal de
George Floyd nos EUA, país mais uma vez retratado por Spike Lee como um império
racista. Certamente, terá lugar de destaque na próxima cerimônia do Oscar.
O roteiro original, com veteranos de guerra que voltam ao
Vietnã em busca de um tesouro e do corpo de um companheiro morto em combate,
perde força no final, caindo literalmente na vala comum. Por isso, está aquém
de seu filme anterior, “Infiltrado na Klan”, este sim entre os maiores
clássicos do diretor e do combate ao racismo.
O filme traz um detalhe brilhante: a maneira como Spike Lee
brinca com o controle remoto da sua Smart TV ao alterar constantemente o
formato da tela, para remeter o telespectador a diferentes épocas e climas de
tensão. Ideia genial nos tempos em que o cinema mudou para a sua sala. Ou
quando ele resolve não alterar o rosto dos veteranos soldados ao retratá-los no
passado, deixando claro que marcas de guerra são para sempre.
Os pontos marcantes em Destacamento Blood ficam com as
referências e críticas pesadas a filmes clássicos sobre a guerra no Vietnã.
Apocalypse Now, o clássico dos clássicos, é agora o nome de uma boate em
Saigon. Não escapam nem mesmo o boina verde John Rambo e o imortal Chuck
Norris. Outros filmes lembrados acidamente são Bom Dia, Vietnã (com um
sarcástico “tenham um bom dia” da rádio comunista direcionado a soldados negros)
e até mesmo Forest Gump (quando um dos personagens, ao contrário do tenente
Dan, sobrevive inteiro à explosão de uma mina terrestre e outros que não
tiveram a mesma sorte).
Mas o maior alvo de Spike Lee em Destacamento Blood não
poderia ser outro. Como ele mesmo chama no filme, “um integrante da Klan
ocupando a sala oval da Casa Branca”. Donald Trump é massacrado do começo ao
fim.
Como se trata de uma caça ao tesouro, há aqui outra
referência implícita: aos filmes sobre a Segunda Guerra que retratam a busca de
tesouros perdidos. Não só Trump, mas o governo americano, é comparado ao
nazismo. Um rajada da metralhadora de Spike Lee.
Fernando Santos é
jornalista e teve a oportunidade de se encontrar com Spike Lee uma vez, no
corredor de acesso aos vestiários do Madison Square Garden, quando o cineasta
foi cumprimentar Kobe Bryant após o jogador do Los Angeles Lakers ter marcado 61
pontos em cima do seu New York Knicks. Sinal de máximo respeito, mesmo de um
ferrenho torcedor rival.